“O inimigo é um excelente professor.” Essa frase do Dalai Lama condensa uma sabedoria milenar. Religiões, doutrinas de combate e tratados filosóficos já perceberam que o inimigo tem um papel educativo. Não por acaso, Plutarco escreveu há dois mil anos um tratado intitulado Como Tirar Proveito de Seus Inimigos.
O que parece contraditório à primeira vista, aprender com quem nos deseja mal, é na verdade um dos caminhos mais rigorosos de crescimento pessoal e político.
O inimigo como espelho
Plutarco não escreve como um moralista. Ele pensa como um estrategista da alma. Mostra que o inimigo nos obriga a sair do conforto, nos força à vigilância, revela nossas fraquezas. Aponta falhas que os amigos, por cortesia ou covardia, ocultam.
Nietzsche dizia que o que não nos mata nos fortalece. Não celebrava o inimigo como um bem em si. Mas sabia que a luta purifica. O herói trágico é aquele que refina a alma com dor, que depura o espírito na fornalha do confronto.
Nossos adversários, ao nos atacarem, prestam um serviço involuntário. Funcionam como espelhos. São reveladores.
A estratégia do confronto
Sun Tzu ensinava que conhecer o inimigo é parte da vitória. Quem não tem oposição corre o risco de apodrecer por dentro. Sem resistência, reina a ilusão da competência.
Napoleão dizia que não se deve interromper um inimigo enquanto ele está cometendo um erro. O inimigo oferece vantagem. Mas também ameaça. Caminhar com um inimigo poderoso é viver na beira do abismo.
O veneno da inveja
Entre todas as causas da inimizade, poucas são tão sorrateiras quanto a inveja. Espinoza disse que o invejoso jamais perdoa a virtude alheia. Ele deseja destruir aquilo que não consegue imitar.
Aristóteles observava que a inveja nasce entre iguais. Quanto mais próximos, maior o risco da traição.
Machado de Assis ironizava dizendo que a inveja é magra porque morde e não come. Mas essa mordida pode ser letal. O invejoso ataca pelas costas. Finge amizade. Fala como admirador. Age como assassino.
Contra isso, o antídoto é a altivez. A grandeza de quem não revida com ódio. A frieza de quem não abaixa o nível.
Paranoia ou grandeza
O general Patton dizia que se deve ter sempre um plano para matar qualquer um que se encontre. A frase soa brutal. Mas retrata a paranoia estratégica de quem vive em guerra.
A ausência de inimigos, no entanto, é sinal de irrelevância. Quem incomoda, incomoda por existir. Churchill afirmou que ter inimigos é sinal de que você defendeu algo importante.
Quem não é odiado por ninguém provavelmente não disse nada que valha a pena.
Olavo dizia que o problema de falarem mal de você não é um problema real. Eles já estão falando. A crítica é inevitável.
O segredo é não reagir com ressentimento, mas com estratégia. A ofensa do inimigo, quando verdadeira, deve ser absorvida como diagnóstico. Quando falsa, desprezada como ruído.
Plutarco propõe esse exercício. Quando atacado, pergunte-se se há verdade na crítica. Se sim, corrija-se em silêncio. Se não, siga seu caminho. A crítica, nesse caso, é vento.
O valor do conflito
Quando o inimigo bater à porta, não fuja.
A educação clássica valorizava a disputa. Sócrates fazia da contradição uma escada para a verdade. Não se evolui sem embate.O conflito refina. Grandes obras nasceram da tensão. Guerras, tragédias, disputas filosóficas.Sim, o inimigo traz riscos. Pode nos destruir. Mas também pode nos elevar. O ressentimento destrói por dentro. A vigilância, ao contrário, fortalece.Ter um inimigo é ter um juiz severo, que não dorme, que torce por sua queda. Mas isso pode ser justamente o que faltava para você subir.Plutarco está certo. O inimigo pode ser útil. Não é agradável. Não é desejável. Mas pode ser útil.
O essencial em poucas linhas
Que eles não nos tornem piores, mas mais atentos. Que nos ensinem, mesmo sem querer, o que ainda falta.
Observe. Escute. Analise. E se for preciso, lute.
Em tempos de polarização política e guerras culturais, essa lição precisa ser lembrada. Não é necessário amar os inimigos. Mas é sábio usá-los como ferramenta de autoconhecimento.
Mas nunca desperdice a oportunidade de crescer.
O inimigo é um excelente professor.
E como todo bom professor, cobra caro pelas lições